Câmara aprova projeto que amplia possibilidade de penhora de bens de famílias.

Proposta permite que um mesmo imóvel seja dado como garantia em várias operações de crédito. Governo fala em reduzir juros; oposição vê risco de ‘confisco’ de bens de famílias inadimplentes.

Por Luiz Felipe Barbiéri e Elisa Clavery, g1 e TV Globo — Brasília

 

Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (1º), por 260 votos a 111, um projeto de lei que amplia as possibilidades de penhora de bens de família oferecidos como garantia em empréstimos. A matéria vai ao Senado.

O texto permite, entre outras coisas, que um mesmo imóvel seja usado como garantia em várias operações de crédito.

De autoria do Executivo, a proposta institui o Novo Marco das Garantias e cria o serviço de gestão especializada de garantias, por meio de uma Instituição Gestora de Garantias (IGGs).

Ao encaminhar o projeto para o Congresso Nacional, no fim de 2021, o ministro da Economia, Paulo Guedes, argumentou que a medida deve facilitar o acesso ao crédito a trabalhadores e empresas e diminuir os juros.

A legislação atual diz que o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável, salvo exceções, como a execução de ‘hipoteca’ sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar.

O projeto altera a redação, que passa a permitir a penhora sobre “imóvel oferecido como garantia real, independentemente da obrigação garantida ou da destinação dos recursos obtidos, mesmo quando a dívida for de terceiro”.

A regra não vale para imóveis rurais oferecidos como garantia real de operações de financiamento da atividade agropecuária, exceto quando se tratar de hipoteca rural.

Com isso, o texto amplia a lista de imóveis que podem ser penhorados. Agora, essa regra alcança qualquer tipo de execução sobre imóvel oferecido como garantia real, o que contempla também a ‘alienação fiduciária’.

Na hipoteca, a propriedade do imóvel permanece registrada em nome do devedor. Já na alienação fiduciária a propriedade é transferida no registro para o nome do credor.

Ao justificar a mudança, o relator, deputado João Maia (PL-RN), afirmou que “não faz sentido destinar tratamentos distintos à hipoteca e à alienação fiduciária em garantia” e “não se deve proteger alguém que oferece imóvel em garantia e, diante do descumprimento de obrigações garantidas, alega a impenhorabilidade do seu bem”.

Além disso, a proposta prevê que um mesmo imóvel seja dado como garantia para várias operações de crédito.

Para a bancada do PSOL, o texto permite que Instituições Gestoras de Garantia (IGGs) possam “confiscar a casa de uma família que eventualmente fique inadimplente”.

“Este projeto possibilita que, colocando o único imóvel da família como garantia, o cidadão tenha acesso a um ou vários empréstimos – o que parece bastante atrativo num primeiro momento. No entanto, caso haja inadimplência de apenas uma das dívidas autorizadas pela IGG, independentemente de aviso ou interpelação judicial, a garantia poderá ser executada, ou seja, a casa será tomada”, argumenta a sigla, em nota.

O projeto também:

  • aumenta o limite do uso de recursos da poupança para operações de financiamento imobiliário;
  • permite resgate antecipado de Letras Financeiras;
  • acaba com o monopólio da Caixa em operações de penhor civil. Pelo texto, as operações deste tipo com caráter permanente e contínuo serão exercidas exclusivamente por instituições financeiras, seguindo regulamentação do Conselho Monetário Nacional (CMN).
  • inclui a possibilidade de o direito minerário – como, por exemplo, alvará de autorização de pesquisa, a concessão de lavra, o licenciamento, a permissão de lavra garimpeira – ser onerado e oferecido em garantia. A medida depende de regulamentação.

Investidores estrangeiros

A pedido do governo, o relator da matéria incluiu um dispositivo para zerar as alíquotas de imposto de renda aos títulos de crédito corporativo de investidores residentes no exterior. A alteração atende a uma sugestão feita pelo líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR).

Segundo João Maia, a medida “corrige distorções na tributação de rendimentos recebidos por investidores estrangeiros em renda fixa”.

O deputado relembra que, atualmente, há alíquotas diferentes para investimentos em títulos de dívida pública, privada, cotas de fundos de investimento e ações.

“Uma das consequências disso é que os investimentos estrangeiros em renda fixa corporativa como proporção do total de investimentos estrangeiros em ativos financeiros no Brasil são significativamente menores do que em outros países”, diz em seu parecer.

O relator afirma que a medida pode elevar o nível de investimentos em determinadas modalidades de ativos no país.

Gestão especializada de garantias

Segundo o texto, o serviço de gestão de garantias deverá ser autorizado pelo Banco Central e regulamentado pelo Conselho Monetário Nacional.

O serviço será prestado por pessoas jurídicas e terá como objetivo “facilitar a constituição, a utilização, a gestão, a complementação e o compartilhamento de garantias utilizadas para operações de crédito”.

O projeto permite que um mesmo bem seja utilizado como garantia para vários empréstimos. Conforme a proposta, no entanto, somente a instituição gestora do bem que já foi oferecido em garantia poderá gerenciar novas operações de garantia sobre esse mesmo objeto.

Pelo modelo, pessoas físicas e jurídicas que quiserem tomar empréstimos junto a instituições financeiras que usam o serviço de gestão de garantias deverão firmar um contrato com essas instituições gestoras, informando a titularidade, as condições de garantia, o valor máximo de crédito entre outras informações.

A proposta fixa como atribuições dessas instituições gestoras, entre outros:

  • a gestão administrativa das garantias constituídas sobre bens imóveis ou móveis;
  • a constituição, o encaminhamento a registro e o pleito à execução das garantias;
  • a manutenção e o controle das operações de crédito vinculadas às garantias;
  • a avaliação das garantias reais e pessoais;
  • a interconexão com as instituições financeiras.

A proposta ainda blinda os contratos firmados pelas instituições gestoras, caso essas empresas entrem em recuperação judicial ou falência.

Se o credor que firmou o contrato for único, ele poderá assumir o compromisso ou transferi-lo para outra instituição gestora.

No caso de mais de um credor, as garantias poderão ser transferidas para nova instituição gestora de garantia, para agente de garantias ou para um dos credores.

 

Fonte: https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/06/01/camara-aprova-projeto-que-amplia-possibilidade-de-penhora-sobre-bens-de-familias.ghtml